terça-feira, 29 de junho de 2010

Pensar Portugal

Portugal regressa mais pequeno do que partiu

«A selecção portuguesa não demonstrou, em momento algum, convicção. Já nem falo em qualidade futebolística. Penso apenas em fé na capacidade própria e na possibilidade de incomodar o adversário, desequilibrá-lo, fazer-lhe mal. E eles, percebeu-se na forma como festejaram no fim, tinham dúvidas. Era «só» encorajá-los a reconhecê-las.

Recordo o posicionamento de Portugal com a Espanha e o Brasil e pergunto-me como foi possível ter chegado aqui. Correndo o risco de ser injusto, acho que a liderança de Carlos Queiroz está a trazer a selecção para um local que tinha abandonado há muitos anos. E isso é capaz de ser grave.

Neste Mundial, quando tivemos de enfrentar os melhores adversários, fomos pequenos. Como noutros tempos, quando entrávamos em campo convencidos de que os outros eram muito melhores do que nós e jogar de igual para igual era algo impensável. Aliás, olhos nos olhos só enfrentámos Costa do Marfim e Coreia do Norte. E é assim que vamos.

Nunca pareceu que a selecção desejasse mais do que sair de cabeça erguida, na expressão, também ela pequena, do seleccionador. Passámos muito tempo atrás, na esperança que Ronaldo surgisse lá na frente, por entre o nevoeiro, e resolvesse. Aparentemente, foi para isso que nos preparámos durante semanas.

Não queríamos uma coisa diferente e, sejamos honestos, não merecíamos mais. Lamentavelmente, voltamos para casa mais pequenos do que partimos. Era o pior desfecho.»

Luís Sobral

segunda-feira, 14 de junho de 2010

ALEMANHA

Como ideia geral há um princípio muito manifesto a partir de onde tudo se concretiza: posse e circulação de bola.
A partir deste princípio de jogo emergem duas dinâmicas de criação e aproveitamento dos espaços, a atracção por jogo interior e a excelente temporização do ritmo da circulação da bola.

Estruturada a partir de um 4x2x3x1, a Alemanha jogando no interior do adversário criava sucessivamente espaços. O princípio é entrar com a bola no meio para atrair. Com uma sucessão de paredes (passe e devolução) e de pontes (3º homem) os jogadores da Austrália eram atraídos a fechar-se na zona da bola e assim a libertar espaços que depois eram aproveitados pela Alemanha. Por exemplo, os centrais Mertesacker e Friedrich a tocar com os médios, Schweinsteiger e Khedira a partir de trás, em paredes sucessivas forçavam o adversário a sair à bola. Em paredes umas vezes, em pontes outras, entrando de Mertesacker para Ozil voltando para Schweinsteiger por exemplo, atraía a Austrália, e assim libertavam-se espaços que eram aproveitados pelos quatro jogadores da frente.
Muitos jogadores a pedir para a bola entrar para finalização e tanto Lahm como Ozil com muita qualidade a meter passe para esses jogadores. As desmarcações circulares, trazendo o adversário ao encontro da bola para simular e pedir a bola em profundidade permitiam que o timing da desmarcação fosse sempre o ideal, fazendo com que a bola entrasse e nunca houvesse fora-de-jogo. Porque havia interacção de quem tinha a bola e de quem a pedia.

No momento de entrada da bola era concretizado principalmente por um jogadores que se encontrava de frente para o jogo. E tem a ver as duas dinâmicas que se fala no início: circulação e temporização. O jogo em «W», ir à frente para vir atrás para voltar a ir à frente em toques curtos permitia variar o sentido do jogo e estar constantemente a receber a bola de caras.
Recebendo a bola de frente, existindo a oportunidade de ver o jogo antes de receber a bola, o campo é grande. Abrem-se possibilidades de entrada da bola, isto porque a bola é pedida constantemente pelos jogadores da frente nos timings ideais. Lahm foi muito importante na entrada da bola e na temporização da circulação da bola. A gestão das diferentes velocidades a dar ao jogo, gerindo o ritmo para atrair ou para entrar para golo, estando a diferença relacionado se metia passe no pé ou no espaço. Por exemplo, as situações de condução interior para atrair o adversário, libertando Muller por fora e os médios centro atrás - que iriam receber de frente - ou o meter passe de primeira para Ozil nas entre linhas eram condicionadas em função do critério que as duas dinâmicas ofereciam. Schweinsteiger também recebia a bola bastantes vezes, e muitas de frente para o jogo, e quando o fazia também era benéfico para a dinâmica da equipa porque ele oferecia um registo diferente à circulação da bola: passe interior, passe longo para segunda estação e condução de bola, para além do remate de longe, que não aconteceu.

No momento da finalização aparecem sempre quatro zonas ocupadas pelos médios e pelos avançados. O critério é o princípio de jogo posicional e as circunstâncias.
No primeiro momento do jogo - nas saídas de bola pelo guarda-redes, nas faltas ou nos lançamentos laterais - o princípio de posse e circulação de bola era claramente manifesto. Nas transições defesa-ataque a mesma ordem: a intenção de manter a bola e circulá-la para atrair o adversário, no entanto com uma condição: no meio-campo adversário.
Assim, o primeiro passe era muitas vezes vertical, acompanhado por uma desmarcação agressiva para esticar o jogo. Ou seja, num primeiro momento havia uma aceleração do ritmo, com uma intenção, a instalação no meio-campo adversário. Depois da entrada da bola no meio-campo adversário, havia temporização - passe recuado muitas vezes - para manter a bola e começar a atrair. Não por etapas mas dentro desta lógica. O prazer de ter a bola, mérito de Low e dos jogadores que escolheu, como princípio de jogo negava a procura «louca» pelo contra-ataque. No entanto, com a entrada de Cacau e Marin, mais descontextualizados, o ritmo mudou e tornou-se mais frenético fazendo com que o princípio de posse não tivesse tanta eficiência.

Em conclusão, a dinâmica da Alemanha, assente num princípio de posse e circulação da bola, para que a partir da sua utilização se possa atrair o adversário e libertar espaços e timings de entrada da bola para finalização. Isto pelo aparecimento no momento certo de Muller, Podolski, Ozil e Klose, apoiados por um jogador que recebia a bola de frente para o jogo e assim aumentava a velocidade para entrada da bola. Ao invés, se o timing de entrada se fechasse, a equipa, pelo prazer de ter a bola e pela redundância que apresentou tinha qualidade para voltar a circular para atrair e a criar espaço novamente.

Simples? Talvez. Se não se perder tempo com máquinas de musculação e se não se jogar com o Pepe no meio-campo talvez seja mais fácil de se alcançar ...

Saber ouvir

«Divertimo-nos a jogar futebol. Sei o que podemos fazer e estou muito feliz com este resultado. Ganhámos o respeito de todos. Estou muito contente, porque fizemos boas trocas de bola e demonstrámos muita velocidade.»

Joachim Low, parabéns.

domingo, 13 de junho de 2010

MÉXICO

Como ideia geral, pareceu-me que o México de Javier Aguirre tem uma intenção de jogo interior, de entrada da bola entre-linhas, para criação de desequilíbrios. Ao mesmo tempo, também senti que não tem jogadores na defesa com eficácia suficiente para criar uma eficiência dominadora e que possa vencer contra adversários mais fortes.


Para a concretização desta ideia, há uma grande primazia à saída em posse a partir de trás. Como elemento fundamental dessa subdinâmica, e talvez a razão para Aguirre ter esta intenção é Rafael Marquez.
No momento da recuperação da bola e em Organização Ofensiva, a intenção é sair em construção a partir de trás. Construção que pode passar por condução para atrair, no entanto, é feita com pouca eficácia. Para a concretização desta intenção Rafa Marquez recua no terreno e cria-se uma linha de três atrás, isto porque os laterais, Salcido e Aguillar projectam-se em profundidade.




Com o recuo de Marquez, no meio-campo, Giovani dos Santos procura buracos para poder receber e a partir daí criar desequilíbrios. Torrado e Juarez ajustam-se para poder receber a bola, mas sobretudo para não taparem Giovani.
No entanto, é aqui, no momento de entrada da bola, que o México sente mais dificuldades, isto porque os centrais, à excepção de Marquez, não têm qualidade de passe e de temporização para entrada da bola no interior da equipa adversária. Por exemplo, um dos centrais, Rodriguez, mais limitado em passe, quando se «atrevia» a entrar com a bola fazia-o sempre para o corredor lateral, em passe longo. Marquez, ao contrário, tem qualidade suficiente para ter variabilidade de entrada no interior e por fora, por «janelas» ou por «portas».
Isto faz com que a ideia de jogo do México seja muito suceptível de ser abalada. Sobretudo em jogos contra a França e contra o Uruguai, onde, previsivelmente, os defesas-centrais do México vão ser mais pressionados.


Em Organização Defensiva, Aguirre talvez percebendo que muitas das carências do México nas últimas grandes provas nasceu da defesa a três, a intenção passa por defender em 4x3x3, conseguindo assim mais coberturas interiores e jogadores em protecção de 2ª estação, sobretudo em cruzamentos adversários ou variações do flanco de jogo.

Mundial 2010



Nos próximos dias, Rui Sá Lemos e João Baptista passarão a escrever sobre as equipas, os jogos e os acontecimentos do Mundial da África do Sul.